Estou sentado sobe minhas pernas, já
não as sinto, o chão é frio. Olho para as grades enferrujadas a minha frente, a
cela fede. Ouço o som dos outros prisioneiros, todos famintos todos mortos.
Isto é a vida real? Ou é só fantasia?
Não á jeito de fugir da realidade?
─ Poupe minha vida, desta
monstruosidade! ─ ouço um dos prisioneiros gritar do fim do corredor. Em meio a
um grito de agonia ouço águem desejar nunca ter nascido.
Estou sentado em uma sela, e agora me
lembro como tudo começou.
O gato abriu seus olhos. Enormes olhos
amarelos, não tinha nada de mais, olhos amarelos em padrões felinos. Ele lambeu
seus bigodes, se espreguiçou e levantou.
Tudo era silencio, um silencio cheio
de ruídos. Para o gato nenhum som fazia sentido, nem o próprio miado que saia
de sua boca. Este gato era branco, não que soubesse disso, e era gordo também,
mas tampouco disto tinha conhecimento. Tudo que precisava saber era que sua
tigela estava cheia de leite, não que soubesse o que era leite.
O gato andou vagarosamente até sua
tigela de leite, sorveu aquele liquido até ficar satisfeito então foi até a
porta. Mas no meio do caminho deitou no tapete e ali voltou a dormir.
O gato acordou, abriu seus enormes
olhos amarelos se espreguiçou. Suas garras arranharam o tapete. Seu dono
balbuciava algo em sua cara. Ele tentava escapar mais era tarde de mais.
─ Quem é a coisinha mais fofa do
mundo? ─ o homem falava, para o gato aquilo não fazia sentido, tudo que ele
queria era sair dali, para ele nada realmente importava.
Depois de alguns minutos ele consegue
fugir das garras do humano. O gato corre na direção da porta, mas algo lhe
chama a atenção. Ele para. Aquele novelo de lã lhe parece muito atrativo. O
gato assume sua posição de caçador, o corpo todo abaixado no chão, seu rabo a
única parte dele que fica para cima, ele abana de um lado para outro. De vagar
o gato se aproxima, as patas dianteiras cravando as garras no carpe. Ele solta
um miado, e salta sobre sua presa, em poucos segundos o novelo está desfeito.
O gato crava suas garras na lã,
desenrolando metros e mais metros dela, ele grita um grito selvagem que nem
sabe por que tem vontade de soltar, crava seus dentes na lã engole um pedaço de
lã e se afoga. Depois disto o novelo perde o interesse. Ela vai a tigela beber
mais um pouco de leite.
Dorme. Abre os olhos, parece que nada
mudou. Ele se espreguiça, desta vez chega a porta, e sai para fora.
O vento sopra, de qualquer maneira o
vento sopra. O gato anda, por onde anda aquele silencio barulhento o acompanhava,
mas na verdade não importava, nada mesmo fazia sentido.
O gato chegou até aquele ponto, o
único ponto que por costume talvez, mas que sempre procurava quando queria
fazer suas necessidades, uma pequena faixa de areia no meio do quintal.
Depois andou pela grama, o vento
soprava, sentiu um cheiro, e começou a rolar no chão. Rolava de um lado para o
outro, a grama fresca e seca lhe era prazerosa, ficou em silencio de barriga
para cima fechou os olhos.
O sol estava quente, e o vento
soprava. O gato abriu seus olhos e olhou para o céu e viu. Mas logo se
esqueceu, afinal era um gato, ele fácil vem e fácil vai. Voltou a andar. De
repente parou, um pássaro, um intruso em seu quintal. Novamente aquele extinto
se apoderou dele. Seu corpo roçou o chão, seu rabo em riste. Seus olhos fixos
na presa. Começou a se aproximar lentamente, mais perto. Mais perto. O pássaro
nem imaginava o perigo que corria. O gato estava quase saltando quando uma
borboleta passou por frente a seus olhos, e bom ele é um gato, fácil vem e
fácil vai. Saiu correndo atrás da borboleta por todo o jardim.
O gato andava por cima da cerca. A
cerca era de madeira ele ziguezagueava pelo meio das estacas de madeira, estava
longe de casa, mas isso não importava.
─ Eu matei um homem. ─ alguém dizia, o
gato ouvia, mas não entendia ─ coloquei uma arma em sua cabeça, puxei o gatilho
e agora ele está morto!
─ Calma, calma. Nós daremos um jeito
cara.
─ Não adianta, chegou a minha hora.
Eles virão atrás de mim.
─ Não fala isso, nós vamos dar um
jeito...
─ Não, pare. Eu não preciso de
compaixão. Apenas vá embora, se eu não estiver aqui a esta hora amanha, siga em
frente.
O gato voltou para sua casa. Estava
cansado. Foi para a tigela, a ração estava lá, ele comeu. Dormiu. Acordou e foi
para a janela. O gato ali ficou parado, ele olhava para o vidro, sem nada
entender, afinal de qualquer maneira o vento sopra, menos por ali. Ele olhava
para seu reflexo no vidro. De tempos em tempos tentava arranhar a imagem. Mas
na maioria conseguia ignorar e ficava apenas olhando a rua.
Sons de carros, pássaros e o do rádio,
ele não diferenciava nada disto. Mas sabia que depois da campainha do colégio
aquelas criaturinhas passavam por ali e ficavam acenando, e gritando, mais sons
que para ele nada significava.
Era noite, estava em cima do piano.
Seu rabo seguia o ritmo da corda do relógio. Um movimento inconsciente. Em nada
ele pensava. O gato ouviu um ruído, virou sua cabeça. E viu a pequena silhueta
de um homem, seu dono se aproximando. O homem coçou entre suas orelhas. Sentou
e começou a tocar.
─ ... Scaramouche! Scaramouche! Você dançará ao fandango?
O gato levanta e sai. De repente
aqueles sons. Raios e trovoes, realmente o assustavam. Ele correu para sua
caixinha. Mas logo a tempestade passa e ele levanta. Vai até a tigela de leite.
E ela está vazia.
“Galileo! Galileo!
Galileo figaro!
Magnífico, oh!”
Estes foram seus primeiros
pensamentos. E hoje estou nesta cela e sou seu prisioneiro.
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