- Marcelo -
O
despertador toca, o desligo e volto a dormir. Cinco minutos depois ele toca
novamente.
─
Mais cinco minutos mãe ─ murmuro desligando ele de novo. Quinze minutos depois
ele toca de novo ─ Maldição! Eu já não desliguei você? ─ grito desligando
novamente. Outros dez minutos se passam, até que ele toca novamente ─ Está bem!
─ grito jogando as cobertas longe ─ você venceu, acordei!
Eu
sento na cama, e caio de cara no colchão no outro extremo dela.
─
Ah segunda feira como eu te odeio ─ eu gemo, então o despertador toca de novo!
─ Um dia eu ainda te jogo da janela ─ resmungo para ele enquanto o desligo pela
quinta vez, ele como sempre entende ameaça e não volta a tocar.
Levanto
então, pronto para o ritual matutino, no caminho até a porta do quarto eu bato
a canela em um criado mudo, depois de praguejar durante um tempo abro a porta.
Reprimo um bocejo então fico seriamente confuso. A porta do quarto de Daiane se
abre e Nando sai dele.
─
Bom dia ─ ele cumprimenta.
─
Devo estar dormindo ainda ─ sussurro para mim, vou ao banheiro.
Depois
de lavar o rosto e aliviar a bexiga sigo para a cozinha, a passar pelo quarto
de Daiane a porta se abre novamente e ela sai dele, fico olhando para ela
sério, balanço a cabeça e resmungo para mim mesmo:
─
Estranho... muito estranho.
A
cozinha já cheira a café, Fernando já providenciou, me sirvo com uma xícara,
depois Milena entra na cozinha.
─
O que faz aqui tão cedo? ─ pergunto para ela.
─
Ainda dormi no quarto do Fernando hoje, não tive tempo de desinfetar meu
apartamento ontem.
─
Hum ─ murmuro.
─
Quem fez o café? ─ ela pergunta se servindo de uma xícara ─ não foi você, foi?
─
Não, foi o Nando ─ respondo ─ ele sempre deixa pronto para mim.
─
Ah! ─ ela responde sentando ao meu lado, Fernando entra na cozinha em seguida.
─
Ainda está aqui Marcelo? ─ ele pergunta.
─
Por que não estaria? ─ respondo.
─
Não vai trabalhar?
─
Vou, por que?
─Você
não deveria estar indo então? ─ ele pergunta olhando para o relógio na parede.
─
Você ainda está aqui então... ─ eu olho para o relógio, 7h 15mim marcam os
ponteiros ─ filho da mãe estamos atrasados ─ eu grito levantando da cadeira em
um salto.
─
Eu to de folga hoje cara ─ ele fala rindo.
─
E por que você não me falou isso antes? ─ grito saindo correndo para o quarto.
***
-Marlon-
Marcelo
quase me derruba quando passa por mim na porta do apartamento.
─
Atrasado de novo? ─ zombo dele, que nada responde. Ouso risos da cozinha e me
dirijo para lá ─ Bom Dia! ─ cumprimento ao entrar.
─
Bom dia ─ respondem todos.
─
Quase perdeu o café ─ fala Daiane, ela está sentada de frente para Nando,
Milena está ao lado dele e é a única que não ri.
─
Que bom que por um terrível engano eu cheguei mais cedo então ─ respondo
sentando ao lado de Daiane ─ Marcelo se atrasou de novo? ─ pergunto.
─
Aham ─ Nando responde ─ parece que nem o despertador que dei para ele
funcionou, o cara parece que tem um dom para se atrasar.
─
E o senhor, pegou a doença dele? ─ pergunto.
─
Que doença? ─ ele pergunta confuso.
─
Virose? Não é essa a desculpa de sempre, quando ele falta ao trabalho? ─ eu
rio, Milena se debruça sobre a mesa, Daiane fica olhando para Fernando com um
olhar fixo.
─
Eu não estou faltando ao serviço ─ ele responde ofendido ─ estou de folga.
─
De novo? Sabe quando eu crescer quero trabalhar no mesmo lugar que você ─ ele
fica vermelho, não sei se de vergonha ou de raiva.
─
Ele está brincando, bobo ─ Daiane fala
empurrando ele, que desvia o olhar de mim para ela e sorri.
─
Sei disso ─ ele fala, reparo que a mão dela fica junto com a dele depois do
empurrão.
─
Quer dizer que voltamos a ser amigos? ─ pergunto adoçando o café.
─
Nós nunca deixamos de ser ─ Daiane
parece reparar que sua mão está junto com a de Fernando e a tira desta posição
e finge segurar a própria xícara.
─
Ok! ─ eu assobio ─ O que temos para hoje então? ─ pergunto.
─
Aula, palestra, as mesmas coisas de sempre ─ Milena responde desinteressada.
─
Vou repor a leitura ─ Fernando responde ─ quem sabe escrever um pouco.
─
Você é tão Nerd ─ Daiane crava as unhas no braço do rapaz.
─
AI! ─ ele grita de dor ─ mas que... por que fez isso? ─ ele fala sorrindo, e
revida arranhando o braço dela, que sorri como se ele estivesse fazendo cócegas
─ não entendo, como você consegue ─ ele olha para mim ─ ela corta as unhas tão
curtas que chega a deixar no vivo, e olha o estrago que ela faz! ─ ele estende
o braço para que eu examinasse, o braço dele estava repleto de linhas
vermelhas, eu levo a xícara a boca de vagar e fico observando os dois, um de
cada vez.
─
Ah droga! ─ Milena fala de repente batendo na própria testa ─ tem mais uma tarefa
a fazer, você ─ ela aponta para Daiane que se retrai.
─O que é que eu fiz? ─ pergunta ela na
defensiva.
─
Vai me ajudar, não ajudar não, você vai limpar meu apartamento, faxina
completa, ninguém mandou me convencer a deixar aquele porco lá!
─
Ah cara ─ Daiane faz uma careta ─ tinha me esquecido disso! Vou ter que passar
na escola de dança, depois vou para lá, bom por falar nisto, esta na minha
hora, não precisam me esperar para o almoço crianças ─ ela fala saindo da
cozinha.
─
Bom acho que vou aproveitar o bonde ─ Milena também se levanta ─ vou ver o
tamanho do estrago na minha casinha.
Uns
minutos depois fico sozinho com Fernando.
─
Então ─ eu gentilmente coloco minha xícara vazia na mesa ─ comece a falar.
─
Falar o que? ─ ele pergunta se levantando e levando as louças sujas para a pia.
─
Olha aqui guri ─ eu engrosso a voz, ele me olha assustado ─ o Marcelo é quase um político, a Ane até
consegue esconder algumas coisas quando quer, mas você! ─ aponto para ele com o
olhar cerrado ─ é uma presa fácil, está na cara que há algo acontecendo aqui,
vamos, desembucha.
─
Não tem nada acontecendo aqui ─ ele fala se virando e começando a lavar a
louça.
─
Não me diga que vocês...
─
Nada aconteceu ok? ─ ele fala abrindo a torneira que espirra encharcando a
camisa dele.
─
Notei que você não voltou para a casa ontem à noite ─ retomo o interrogatório ─
você estava já cedo aqui, e com a mesma roupa de ontem, está na cara que dormiu
aqui e como Milena ainda estava aqui está noite, bom isso nos deixa com apenas
uma opção ─ ele continua quieto ─ e por julgar a repentina retomada de
comportamento de vocês dois, diria que você e a Ane...
─
Nada aconteceu está bem! ─ ele aumenta a voz quase próximo ao grito ─ nós só
dormimos juntos, como... bons amigos que somos.
─
A-rá! ─ grito ─ sabia, vocês hein está quase virando rotina isso...
─
Nada a ver ─ ele resmunga ─ ela estava mal, precisando de um amigo, nada mais ─
eu me levanto e deslizo pelo piso até se encostar na pia.
─
Esta virando rotina e você bem que esta gostando não é? ─ pergunto com um
sorriso travesso, ele não fala nada, mas enrubesce ─ você ainda gosta dela né?
─ pergunto ─ desde que você chegou aqui, nem o fato dela ser gay mudou isso não
é? ─ ele me olha ainda calado ─ sabe, sempre achei que vocês se completavam, tipo
você combinam ─ ele passa a enxaguar as xícaras, eu pego um pano e começo a
secar a louça, ficamos um segundo em silencio então eu o cutuco e sussurro ─
posso te contar um segredo?
─
O que? ─ ele pergunta também num sussurro.
─
Ela também gosta de você ─ respondo.
─
Rá! ─ ele ri, depois fica sério ─ ela te disse isso?
─
Não precisa ─ respondo ─ até um cego pode ver isso ─ ele sorri desacreditado ─
Sabe, vou te ajudar com isso, sempre quis bancar o cúpido.
─
Do que está falando? ─ ele termina de lavar a louça e começa a enxugar as mãos
na roupa ─ Me responda então senhor cúpido, como é que eu, uma pessoa que pode
contar nos dedos com quantas meninas ficou nos seus 19 anos de vida, vou
conseguir fazer uma guria quase quatro anos mais velha, linda e... ah sim,
lésbica que só neste ano já ficou com mais de cinqüenta outras gurias, a
digamos magicamente querer ficar comigo? ─ ele pergunta em um tom de deboche.
─
Reconheço que temos muito trabalho a fazer ─ eu falo, depois o cutuco novamente
─ mas o mais difícil você já fez ─ falo sorrindo depois sussurro no ouvido dele
─ você já conseguiu fazer ela se apaixonar por você, falta só nós conseguirmos
fazer ela se dar conta disso.
***
- Nando –
─
Está pronto? ─ Marlon aparece na porta do meu quarto.
─
Hmm, não estou certo se devo mesmo fazer isso ─ admito, ele me puxa pelo braço.
─
Bobagem docinho ─ ele me leva pelo corredor ─ conheço a pessoa certar para nos
ajudar nesta operação.
─
Quem? ─ pergunto, ele para por um segundo me olha sério depois fala voltando a
andar.
─
Você vai ver.
** Trinta minutos e cinqüenta segundos
depois**
─
Não espera que eu pague o taxi também não é? ─ Marlon me pergunta revirando os
olhos e cruzando os braços em frente ao corpo.
─
Não, pode deixar ─ falo abrindo a carteira e passando o dinheiro para o
taxista.
─
Nossa, o Marcelo deve se divertir muito com você ─ ele fala saindo do carro ─
estava brincando, eu pago a volta.
─
Dalas? ─ eu leio o letreiro que
brilha em neon.
─
É achei que você iria ficar com vergonha de entrar no buenas noches ─ ele fala
sorrindo ─ vamos? ─ eu empaco no lugar ─ não é um clube gay ─ ele fala me
puxando pelo braço.
Eu
o sigo, ao entrar não vejo nenhuma diferença deste clube para qualquer outro
que já tenha ido. A entrada está repleta de casais se pegando, a musica chega
abafada da pista e aumenta cada vez que nos aprofundamos no prédio.
─
Então, onde vamos encontrar esse seu amigo? ─ pergunto, já tenho que aumentar a
voz para que Marlon me escutasse.
─
Ele disse que estaria no bar ─ ele responde.
Marlon
me guia pelo meio de pessoas que dançavam, ou apenas bebiam em grupos, o bar
ficava do lado oposto ao palco com as caixas de som, então o som era alto, mas
podia-se conversar. O bar tinha pelo menos dez banquetas giratórias, e delas
apenas uma estava ocupada no momento.
Marlon
se aproxima do homem que esta sentado de costas para nós e conversa com uma das
garçonetes, Marlon nem nos anuncia e a pessoa gira na banqueta.
─
Alguém esta precisando de umas aulas com o Doctor Sexy ─ Marcelo esta com uma
taça de Martine com uma cereja em uma das mãos.
─
Você chamou ele? ─ pergunto incrédulo para Marlon, ele encolhe os ombros e diz:
─
Temos que admitir ele é nosso melhor soldado neste assunto.
─
Não se preocupe priminho querido ─ Marcelo levanta da banqueta e passa o braço
por trás dos meus ombros ─ sabia que esta hora chegaria, cedo ou tarde você
viria atrás de minha sabedoria, pensei muito se faria este favor para ti e
decidi que já que você não tem nenhum irmão mais velho para lhe ensinar isso eu
posso lhe passar alguns truques.
─
Espere um pouco, você também não tem irmão! ─ falo para ele, que sorri.
─
Exatamente, mas eu fiz um bom trabalho em crescer ─ ele da um peteleco na minha
testa e se senta novamente na banqueta de frente para mim, apoiando um dos
braços no balcão do bar ─ Bom ─ ele começa tomando um gole do Martine ─ como
disse resolvi te ajudar, por que sou uma pessoa boa, mas tenho uma condição ─
ele toma outro gole ─ quem é a presa? ─ ele pergunta, eu e Marlon nos
entreolhamos por um momento ele anui, Marcelo enche a boca em um ultimo gole da
taça.
─
A Ane! ─ respondemos em uníssono, sou atingido por uma baforada de gotículas de
Martine quando Marcelo joga fora todo ultimo gole da taça no ar.
─
Rá! ─ ele uiva em uma gargalhada ─ a Ane? ─ pergunta em meio as gargalhadas ─
cara quero te ajudar, mas não faço milagres! A Ane é mais homem que nós três
juntos!
─
Pode ser ─ Marlon fala ─ mas o jovem guerreiro aqui, conseguiu fazer com que
ela se apaixonasse por ele.
─
Humpf! ─ Marcelo bufa ─ impossível.
─
Estou dizendo ─ Marlon defende, os dois falam como se eu não estivesse ali ─
ninguém entende melhor a alma de uma mulher do que um Gay, já que somos meio a
meio ─ ele ri para ele mesmo ─ e eu posso dizer com cem por cento de certeza...
─
Impossível ─ Marcelo continua ─ ninguém deflorou mais almas femininas do que
eu, e nesta eu nem consegui chegar perto! ─ ele fala.
─
A alma de uma mulher não é aquilo que fica entre as pernas delas! ─ Marlon fala
emburrado.
─
Não? ─ Marcelo pergunta confuso, depois sorri malicioso ─ de qualquer jeito ─
ele continua ─ decido agora que não posso fazer isso ─ ele gira para o bar ─
ela está namorando, não posso estragar minha estratégia no jogo...
─
Ela terminou com a bruna ─ falo por instinto, ele gira novamente com muita
velocidade.
─
O QUE?! ─ ele grita ─ isso não pode, nem é ─ ele começa a contar nos dedos ─
setembro ainda! Eu não consegui chegar nem perto dela no quadro! ─ ele me olha
sério ─ seu ratinho maldito ─ por um momento chego a ficar com medo dele ─
aposto que você tem algo a ver com isso! Bom agora é um caso de vida ou morte,
vou ter que fazer milagre! Mudei de idéia de novo, vamos começar o trabalho.
─
Oba! ─ Marlon bate palmas.
─
Bom primeira lição ─ Marcelo volta a sua feição normal ─ Confiança! Essa é a
chave, agora escute com atenção ─ meu primo apóia a mão esquerda no meu ombro e
apontou a direita no meu rosto ─ este é o meu segredo, é uma espécie de mantra,
agora eu quero que você repita comigo ─ eu olhei fixo para ele quando ele
começou a recitar ─ “Eu nasci pelado, careca e sem dente, sem nada neste mundo
então o que vier é lucro!”.
─
É só isso? ─ Marlon falou com as sobrancelhas franzidas ─ esperava mais.
─
Confia em mim cara, isso faz milagres! ─ Marcelo fala para Marlon ─ agora, a
segunda coisa! Eu conheço você, então sei que você vai precisar de uma certa
coragem liquida! Débora querida ─ meu primo chama, uma das garçonetes uma
morena de olhos verdes se aproxima sorrindo ─ Pode ajudar com isso?
─
Claro que sim lindo ─ a moça pega um copo e coloca em cima do balcão depois
tira de uma das prateleiras uma garrafa de wiskey.
─
Muito obrigado ─ Marcelo fala enchendo o copo e me oferecendo ─ Vira!
Eu
pego o copo e fico olhando o liquido.
─
Não temos a noite toda querido ─ ele fala eu viro tudo em um gole só, a bebida
desce queimando eu me engasgo.
─
Muito bem ─ Marcelo observa a pista de dança ─ quero que você chegue naquela
guria lá e diga o seguinte ─ ele sussurra no meu ouvido ─ você se machucou
muito? Digo quando caiu do céu?... anjo ─ ele sorri ─ vai lá cara, não se
esquece do mantra.
Eu
fico por uns dez segundos parado então vou falar com a guria que Marcelo
indicou, ela era bonita loira alta, vestia um vestido preto muito curto, ela
sorri com as amigas enquanto dança.
“Eu
nasci pelado, careca e sem dente, sem nada neste mundo então o que vier é
lucro!”... repeti o mantra de Marcelo. Respirei fundo e repeti de novo “Eu
nasci pelado, careca e sem dente, sem nada neste mundo então o que vier é
lucro!”.
─
É... com licença? ─ eu a chamo em um canto, posso sentir que suor escorre de
minha testa, dou graças por estar escuro ai ─ mas eu gostaria de saber se você
se machucou muito? Digo quando caiu do céu? ─ ela revira os olhos.
─
Não muito, mas já você, não preciso nem perguntar não é? Caiu da arvore da
feiúra e bateu em todos os galhos antes de chegar ao chão não é? ─ ela
responde, joga o resto de sua bebida na minha cara ─ Palhaço! ─ fala então
voltando para junto das amigas.
─
Então? ─ Marcelo pergunta quando eu chego perto deles ─ deu certo?
─
Claro que não! Ela respondeu que eu cai da arvore da feiúra e Bati em todos os
galhos até chegar ao chão ─ falo.
─
Que cruel! ─ Marlon murmura, ele está sentado ao lado de Marcelo, que gargalha.
─
As vezes elas são ─ Marcelo responde para Marlon ─ mas Isso foi falta de
confiança ─ Marcelo se levanta entrelaçando os dedos das mãos e as esticando
acima da cabeça ─ observe.
Marcelo
vai até a mesma moça que tinha me mandado pastar, fala algo no ouvido dela que
sorri e responde algo, Marcelo fala mais algo os dois se afastam das amigas
dela, menos de dez minutos depois os dois se beijam e Marcelo a deixa no meio
da pista meio confusa.
─
Viu o que disse? ─ Marcelo fala ao chegar perto de nós ─ confiança! Não é o que
se fala, mas sim como se fala! ─ ele senta na banqueta e scaneia a pista com o
olhar ─ ok, sua vez agora ─ ele indica uma guria sozinha ─ nesta você chega e
fala ─ ele faz uma pausa como se estivesse pensando então continua ─ não sei se
é seu aniversario, mas você está de parabéns... ─ Eu nem discuto com ele sobre
quão idiota é o que ele acabou de falar, me viro para ir até ela ─ Hei machão,
vai aonde? Não está esquecendo de nada? ─ me viro para ele, meu primo está
segurando mais um copo cheio, eu o viro e vou...
“Eu nasci pelado, careca
e sem dente, sem nada neste mundo então o que vier é... é... lucro!”.
Dois
copos, as paredes começam a se mover sozinhas, o chão já está quase irregular,
até mesmo o mantra de Marcelo fica difícil de lembrar. Chego perto da moça,
abro a boca para falar algo, mas ela nem me da chance sua mão desce em um arco
e eu sinto ela ferver no meu rosto.
***
─
Então? ─ Marcelo pergunta quando chego ao bar, é um pergunta idiota ele pode
ver tudo de onde estava ─ Próxima!
***
“Eu nasci pelado (...) sem nada neste mundo
então o que vier é lucro!”.
Outro
tapa...
Outro
gole...
Outra
garota...
“(...) careca e sem
dente, (...) então o que vier é... lucro!”...
...Outro
gole...
Outra
cantada estúpida...
Sinto
o álcool fazendo efeito a cada lombada que encontro na pista.
“Eu
nasci pelado, (...) sem dente, sem coisa nenhuma pra este mundo então... o que
vier é lucro!”.
***
- Marlon –
─
Isso é cruel, Marcelo, olha o estado que o guri está! ─ murmuro, Nando está
debruçado no bar e está se babando ─ foram o que doze doses?
─
Mais ou menos ─ Marcelo responde erguendo a garrafa vazia ─ isso vai ser uma
fortuna para ele.
─
Chega, isso já foi longe de mais ─ falo ─ não esperava que ele conseguisse
alguma coisa da primeira vez mesmo.
─NÃO!
─ Marcelo grita batendo com a mão aberta no bar, isso acorda Fernando ─ a vida
é cruel! Ele tem que passar por isso, todos temos que passar por isso, não
quero que ele seja um moleque para sempre! ─ eu o olho sério, então ele sorri ─
Desculpe, eu vi isso em um filme e
sempre quis repetir.
─
Que tipo de filme era esse? ─ pergunto.
─
Ah, não lembro o nome, só sei que era um pai incrível ensinando o filho a ser
igual a ele...
─
E por incrível você quer dizer?
─
Hora, igual a mim, que outra definição de incrível você poderia encontrar? ─
ele pergunta, não respondo, Nando acordou do nada.
─“Eu
nem nasci, careca e sem dente, só sei que vim sem porcaria nenhuma neste mundo
então o que vier é um montante positivo! ─ Nando fala tropicando nas palavras,
se levanta do bar vai tropicando até uma guria a poucos metros dali, não fala
nada, só a agarra.
─
RÁ! ─ Marcelo pula de alegria ─ viu só o que disse?
─
Marcelo? ─ eu o chamo ─ aquela mulher não tem... ─ eu passo a mão no meu
pescoço ─ não tem algo a mais no pescoço?
─
Aham ─ ele concorda.
─
Nós não devíamos...
─
Ná ─ ele se levanta do bar ─ nosso trabalho aqui está terminado, pode marcar
isso tudo na minha conta Bia... ─ Marcelo fala para uma das moças do bar e
começa a sair ─ Ah! Mais uma coisa ─ ele se vira para mim ─ nunca pensei que
você fosse tão cruel Ma-mah.
─
Eu! Cruel? ─ grito incrédulo.
─
Sim ─ ele olha para Nando que ainda está em um emaranhado de um só com a guria
─ a Ane pode até estar como você disse apaixonada por ele, até a Milena acho
que vê, mas... seja como for, isso nunca vai dar certo, ele vai sofrer, você
sabe disso, e mesmo assim você da corda a ele?
─
Você está errado Marcelo ─ falo não menos incrédulo do que antes ─ os dois são
perfeitos um para o outro, um completa o outro, posso sentir isso.
─
Bom, espero que isso sirva para lhe fazer dormir quando o remorso te manter
acordado a noite.
Marcelo
vai embora me deixando corroído por pensamentos, depois de um tempo sentado
sozinho resolvo levar Fernando para a casa. Quase tive que brigar com a moça que ele estava para conseguir tirar
ele do clube, só espero que ele não me odeie para sempre, quando começarem a
contar a história que ele ficou com um travesti.
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