07/09/15
-Nando-
A
chuva cai torrencialmente lá fora, o frio chegou inesperadamente, ainda bem que
é feriado, estamos todos na sala, Marcelo em um colchão de solteiro que trouxe
para a sala, está de baixo do cobertor e com a cara inchada de tanto dormir.
Marlon
está sentado no sofá acima de onde Marcelo está deitado, está com o cabelo
bagunçado de regatas e um calção muito parecido com uma sirola, graças a deus
ele está debaixo de uma manta.
Milena
está ao lado de Marlon divide com ele a manta, está como sempre toda vestida de
preto, sua camisa tem uma caveira desenhada em branco e um lassinho em vermelho
onde deveria ser a orelha.
Eu
estou meio deitado em outro sofá, Daiane está ao meu lado, todos assistimos ao
desfile transmitido pela teve aberta.
─
De que adianta TV acabo se qualquer chuvinha faz com que o sinal caia? ─
murmuro, um trovão ribomba lá fora como se a chuva tivesse se insultado.
─
Mesmo que tivesse funcionando ─ Milena continua ─ trezentos e tantos canais e
nós não íamos encontrar nada que prestasse mesmo.
─
Hei ─ Marcelo resmunga ─ não insultem a minha querida TV paga!
─
Sua?! ─ Daiane pergunta sarcástica, ele não responde, aposto que colocou em uso
sua audição seletiva e preferiu não ouvir o que ela disse.
Ficamos
por uns bons dez minutos em silêncio, olhando para tela da TV sem ver nada,
apenas por fazer.
─
Tive uma idéia ─ eu começo a falar todos olham na minha direção em sincronia,
um movimento quase cômico ─ estive pensando, quero dizer, faz tempo que tenho
essa curiosidade, como vocês se conheceram? ─ eu pergunto.
─
Hum ─ Daiane murmura voltando a olhar para a TV.
─
Compartilhar histórias? ─ Milena amarra a cara ─ bom, não era bem o que eu
tinha em mente para o feriado, mas ouvi falar que isso é algo que grupos de
amigos fazem, pois bem eu topo.
─
Só por curiosidade, qual era o seu plano para o feriado? ─ Daiane pergunta.
─
Ah, sabe né ficar quietinha em um canto aproveitando o silencio ─ ela da de
ombros, Daiane rola os olhos.
─
Uh-uh! ─ Marlon pula no sofá como uma criança entusiasmado ─ eu começo! Hã
deixe me ver...
***
Lembrança 1: Ma-mah & Ane.
─
Banheiro feminino ─ eu leio em um sussurro, olho para o corredor da faculdade,
está totalmente vazio, posso até figurativamente um rolo de palha seca rolando
pelo piso, bato na porta ─ Olá? ─ falo ─ não se preocupem moças eu sou gay.
Abro
a porta, então como se tivesse entrado em outra dimensão, sou levado por uma
multidão de meninas saindo correndo aos gritos, depois que a ultima passa por
mim em uma cadeira de rodas eu entro. Vejo que uma ultima moça fica lá dentro.
─
É, não se preocupe ─ falo meio sem jeito ─ não importa o que aquelas loucas
gritaram ao sair, você não precisa se preocupar, como já disse sou gay e não um
tarado pervertido ─ falo, a guria nem desvia o olhar do espelho está retocando
o batom, não espero por uma resposta minha bexiga me lembra do por que estou
ali com uma pontada e eu corro para a privada. Ao sair vejo que a guria ainda
está de frente ao espelho, agora passa sombra ao redor dos olhos.
Vou
lavar as mãos e durante todo o tempo ela não fala nada. Então minha paciência
acaba.
─
Desculpe ─ começo ─ mas por que você não saiu correndo também?
Ela
me olha pelo espelho, sem falar nada ela vai até as portas fechadas dos
banheiros e as abre, depois que se certifica de que estamos sozinhos ela volta
para o espelho.
─
Eu também sou gay ─ ela da de ombros.
─
Mintira ─ eu quase grito ─ como é que
nunca nos vimos por ai! Você não costuma freqüentar os barzinhos por ai? Ou sei
lá exposições de arte... ou...
─
Não ─ ela fala calmamente retirando o excesso de batom do quanto da boca ─
prefiro jogar bola.
─
Cruzes! Que tipo de gay é você? ─ pergunto mexendo na bolsinha de produtos de
beleza que está em cima da pia.
─
Do tipo que gosta de meninas hora ─ ela dá de ombros ─ sou lésbica Dã!
─
Ah sim ─ falo.
─
E por que em sã consciência você está usando o banheiro das meninas? ─ ela
pergunta.
─
Bom os garotos não gostam que eu use o mesmo banheiro que eles ─ falo ─ ficam
intimidados quando não consigo desviar o olhar do... sabe ─ ela me olha
incrédula.
─
Você não sabe disfarçar não? ─ ela pergunta olhando diretamente para mim.
─
E você não saiu do armário ainda? ─ pergunto tentando mudar de assunto.
─
Não aqui, da onde se é louco? ─ ela sorri maliciosa ─ e ter que usar o banheiro
dos homens ao invés de ver um desfile particular de beldades de roupas intimas?
─
Ah, inteligente ─ murmuro.
─
A propósito, sou Daiane! ─ ela estende a mão ─ pode me chamar de Ane, faço
dança, e você?
─
Marlon ─ respondo apertando a mão dela, “aperto
forte” penso ─ ou Ma-mah, eu odeio, mas você vai acabar descobrindo de um
jeito ou de outro, faço teatro.
***
─ Eu sabia! ─ Marcelo grita quando Marlon
termina ─ sabia que você ficava me espiando no vestiário do clube!
─UUUIIII!
─ Marlon grita deitando no sofá tão exageradamente que quase cai no chão ─
abana! Abana! ─ ele começa a se abanar com as mãos.
─
O que foi? ─ Milena pergunta o segurando pela camisa ─ você está bem? ─ Milena
começa a abaná-lo também.
─
Marcelo ativou minhas melhores lembranças ─ ele se endireita no sofá ─ ui ─
suspira por fim, Milena o acerta com a almofada.
─
Próximo? Ane? Como é que você conheceu o
Marcelo? ─ pergunto.
─
É mesmo ─ Marlon concorda ─ desde que te conheço você carrega ele pra cima e
para baixo, não que eu esteja reclamando ─ ele estremece ─ ai... mais
lembranças.
─
Cara eu estou me sentindo invadido! ─ Marcelo murmura saindo do colchão e indo
se sentar ao lado de Daiane, o sofá fica apertado Daiane, passa os braços em
volta do meu pescoço.
─
Promete que não vai usar tudo isso para escrever um livro depois? ─ ela
pergunta.
─
Prometo não citar nomes! ─ eu respondo.
***
Lembrança numero 2: Ane & Marcelo.
Eu
tinha ido com uma amiga aquela festa, não conhecia ninguém além dela. Haviam
umas dez pessoas, alem de nós, a festa rolava normalmente, até que o anfitrião
já alterado por algumas doses derrubou toda a sua bebida em mim, encharcando
minhas roupas.
Eu
tinha dado uns tapas no cara para me sentir melhor, então Marcelo chegou, logo
que me viu identificou um alvo, soube disso por que ele fez o mesmo olhar que
eu dava quando encontrava uma presa em uma balada.
Resolvi
brincar com ele um pouco, durante a noite inteira ele me cantou, no inicio
minha amiga que já o conhecia disse que eu estava namorando e que era fiel, ele
não desistiu, ela não revelou que eu era lésbica, e quando percebeu o que eu
estava fazendo, nos deixou a sós.
No
fim da noite, quando ele estava no ponto onde considerava tudo acabado, eu
revelei que era gay e que não estava nenhum pouco interessada nele.
***
─
Daquele momento em diante nós viramos rivais para todo o sempre ─ Marcelo falou
concordando com a história narrada por Daiane, os dois bateram as mãos se
cumprimentando ─ quando conheci a Ane, ela e Marlon já eram amigos então ele
veio junto no pacote ─ Marcelo falou evitando olhar para Marlon.
─
Bom ─ Milena começou depois ─ eu podia contar de como cheguei ao prédio, mas
realmente não estou com vontade, e como vocês todos com exceção do Fernando já
sabem, vou fazer um resumo.
“
Eu já conhecia o Marlon, nós estudamos juntos no colégio, ele que me indicou o
meu apartamento aqui no prédio, quando me mudei esses dois abutres ─ ela falava
olhando para mim, e indicou Daiane e Marcelo ao falar ─ caíram em cima de mim
como se eu fosse um animal morto, foram o que? ─ ela parou olhando para Marlon
─ dois meses até que eles desistiram não foi?”
─
Mais ou menos ─ Marlon concorda ─ primeiro foi o Marcelo ─ ele continua ─ foi
engraçado, ele também tentou de tudo com você, é claro que eu como bom amigo
que sou já tinha avisado a você sobre o que ele era...
─
Salaflário você me dizia que não tinha falado nada sobre nós ─ Marcelo reagiu
irado.
─
Depois de desistir ─ Marlon continuou ignorando Marcelo ─ Ele chegou para a Ane
e disse: “Ela é das suas, só pode” ─ Marlon imita o tom da voz de Marcelo ao
dizer ─ depois foram mais umas semanas das tentativas de Daiane, eu dizia para
a Mih que eu tinha contado para os dois que ela era assexuada ─ ele começou a
esfregar a mão como um vilão de filme antigo contando seu plano maligno ─ mas
não contei nada ─ ele começa a sorrir ─ mas no fim foi a Milena mesmo que
contou, e acabou com a minha diversão.
Todos
ficaram quietos por um bom tempo, então Daiane quebrou o silencio.
─
E vocês dois? ─ ela perguntou.
─
Quem? Eu e o Marcelo? ─ perguntei.
─
É ─ ela concorda.
─
Hora nós somos primos, então nós conhecemos ainda crianças ─ eu respondi.
─
Bom você era criança eu já era quase homem feito ─ Marcelo interrompeu.
─
Você é só quatro anos mais velho do que eu! ─ eu falo para ele.
─
É verdade ─ Marlon concorda com Daiane ─ vocês devem ter um monte de histórias
de infância.
─
Na verdade não ─ eu falo.
─
É, não... ─ Marcelo concorda indiferente.
─
Ah, qual é? ─ Daiane nos pressiona ─ vocês se conhecem desde sempre, alguma
história vocês devem ter.
─
Não, é sério, não me lembro de... ─ eu começo, Marcelo começa a rir consigo
mesmo.
─
Bom tem aquela vez ─ ele começa ─ que eu fiz você brigar com o seu melhor amigo
─ ele fala eu o olho sério.
─
Do que esta falando? ─ pergunto.
─
Daquele que morava na esquina da sua rua lá como era mesmo o nome?
─
O Diego? ─ pergunto sem certeza.
─
Acho que sim, se lembra daquele dia que nós estávamos brincando de jogar pedras
para o alto, e vê-las cair? ─ ele pergunta.
─
Aham ─ concordo ─ era sim, o Diego aquele idiota jogou a pedra na minha direção
─ ele gargalhou.
─
É, bom acontece que fui eu que taquei a pedra para ver se você iria gritar
muito ─ ele fala ─ e não é que você gritou como uma menininha.
─
Também seu... ─ eu começo a gritar com ele.
─
Espere um pouco ─ Milena me interrompe ─ Por que raios vocês estavam jogando
pedras para o ar? Tipo... qual é o sentido nisso?
─
Nós éramos crianças! ─ eu e Marcelo falamos em uníssono ─ é isso que pia faz
quando é pequeno ─ eu continuo como se isso fizesse muito sentido.
─
Tai ─ Daiane fala ─ nunca vou entender a cabeça de vocês!
─
Que tipo de Gay é você? ─ Marcelo fala com as mãos acima da cabeça igual ao meme do Jack Chan.
─
Desculpe, acho que nesta parte fui menina ─ ela responde.
─
Nossa, tenho muito dó de você Nando ─ Marlon começa ─ o quanto esse crápula não
se aproveitou de você?
─
Bom... ─ eu começo querendo me vingar de Marcelo ─ teve uma vez que ele não
conseguiu.
***
Lembrança numero 3:
Marcelo 1 vs 1 Nando
Eu,
Marcelo e um outro guri (não me lembro o nome deste) estávamos na frente da
casa de Marcelo.
─
Vamos jogar bola! ─ Marcelo está chutando uma bola velha de couro no muro da
casa, eu e o outro guri estávamos jogando em um vídeo game portátil logo ao
lado.
─
Não, nós estamos quase chegando no chefão! ─ eu murmuro de volta, eu tinha seis
anos Marcelo dez.
─
Ah! ─ Marcelo começa a resmungar com ele mesmo.
Eu
e o outro guri estamos vibrados na mini tela do mine vídeo game, quando ouvimos
um chute depois o som de vidro se estilhaçando. Eu desvio o olhar do vídeo
game, Marcelo estava com os olhos arregalados maxilar rangendo, as mãos se
agitando em frente ao corpo. O outro guri e eu estamos com as gargalhadas
cavalgando pela garganta.
─
Shiii ─ Marcelo se senta ao nosso lado ─ pode ser que ela não escutou...
─
MARCELOOOOOO!!!! ─ minha tia grita da lavanderia da casa.
─
Não fui eu manhe ─ ele grita de volta ─ Foi o Nando!
***
─
Foi muito bom ver você levar aquelas palmadas ─ eu falo para ele.
─
Se aquele miseravélzinho que se dizia meu amigo não tivesse me entregado ─ ele
resmunga ─ já que você lembrou dele, por que não contar daquela vez da
tempestade? ─ ele fala sorrindo maroto.
***
Lembrança numero 4:
Marcelo 2 vs 1 Nando
No
mesmo ano, o rapaz (também não consigo me lembrar dele) estava ali também,
estávamos na casa de Nando desta vez, a casa tinha na parte de trás uma espécie
de sala fechada que sei lá qual era a intenção do vovó quando construiu aquele
lugar, mas naquele dia ele era um oceano.
Tínhamos
colocado uma rede de uma parede a outra, a rede estava podre de tão velha, mas
criança não vê perigo.
─
Todos abordo! ─ Nando está sorrindo com um chapéu de jornal torto na cabeça, o
outro guri pula para a rede, os dois começam a balançar a rede, as cordas
rangiam no gancho ─ é uma tempestade marujos! ─ ele gritava, e a rede balançava
─ Vem! ─ Fernando me chamou ─ Homem ao mar! ─ gritou, eu pulei para dentro da
rede onde os outros dois estavam.
─
Olha a tempestad... ─ eu comecei a gritar, quando as cordas cedem.
***
─
Eu lembro que cai em algo macio ─ ele termina rindo.
─
É por que você caiu em cima do guri lá, e ele em cima de mim ─ falo reinando ─
eu é que parti a cabeça naquele concreto puro que tinha lá em casa, ainda tenho
a cicatriz ─ falo passando a mão no topo da cabeça.
─
Espere um minuto ─ Marlon começa ─ vocês estavam em trenzinho em uma rede? ─
ele fala, eu e Marcelo olhamos para ele de cenho franzido ─ UIIIII, ABANA!
─
Que foi agora? ─ Milena começa a abanar.
─
Imaginação! ─ Marlon começa a falar.
─
E a vez que eu te fiz ficar em coma? ─ Marcelo recomeça a falar, Daiane sente
os ânimos se acirrarem e sai do sofá indo se sentar no colchão que a pouco
tempo Marcelo estava, os três olham de mim para Marcelo como se estivessem
acompanhando uma partida de ping pong.
─
Não me lembro disso, você sabe que a proposta era as histórias serem
verdadeiras não é? ─ falo para ele.
─
Mas essa aconteceu ─ ele responde seguro de si.
─
Eu só fiquei na UTI uma vez na vida, e foi... ─ ele começa a fazer que sim com
a cabeça e seus olhos brilham de uma maneira psicótica.
***
Lembrança numero 5
Marcelo 3 vs 1 Nando
─
Oi tia! ─ eu cumprimento a mãe de Nando que esta na área da casa regando as
flores.
─
Oi querido ─ ela responde ─ como é que você está? ─ ela pergunta.
─
Bem ─ respondo.
─
E a vovó? ─ ela continua, eu tinha dezesseis anos, neste tempo eu estava
morando com a vovó Cris.
─
Bem também ─ respondo ─ o Nando está? Ele pediu para que eu passasse aqui.
─
Ele não chegou ainda ─ respondeu minha
tia ─ foi dar uma volta com o presente de aniversario dele ─ ela sorriu.
─
Aé, é aniversario dele, bem que a vovó me falou ─ eu minto, nem sabia, muito menos
a vovó ─ bom eu vou indo então, outra hora eu passo por aqui, diz para ele que eu
passei por aqui?
─
Pode deixar ─ ela responde.
Eu
me viro e começo a se afastar da casa, ando uma quadra quando ouço o grito de
Nando.
─
Hei Primo! ─ ele grita do topo da subida que a rua fazia, era uma ladeira tão
íngreme que quase que quem a subia tinha que fazer isso de pé ─ ta vindo carro
ai?
Eu
olho para um dos lados da esquina em que me encontrava, não vinha nada, olhei
para o outro.
─
Não!... ─ gritei a resposta e fiz uma pausa para a piada ─ Ta vindo um Uno!
Tudo
pareceu em câmera lenta, Nando não tinha esperado eu completar a frase e montou
na bicicleta nova, as fitas do embrulho ainda balançavam ao vento amarradas no
guidão, vi o grito de UHUU! Dele entalando na garganta e a face transbordando
de terror.
Foi
quase que cronometrado, o carro chegou na esquina ao mesmo tempo em que a
bicicleta do Nando, ele afundou na lataria do carro, sangue para todo lado, o
motorista gritando aterrorizado depois de recobrar os sentidos.
Eu
olhei para um lado, depois para o outro, e atravessei a rua em segurança e
assoviando fui para a casa.
***
─
Eu quase morri naquele dia! ─ gritei irado, Marcelo deu de ombros.
─
Pelo menos eu não menti, só estava vindo um uno Horas!
Todos
na sala estavam em silencio, eu podia sentir minha face vermelha, de raiva,
estava a ponto de pular no pescoço dele, mas então uma lembrança me atingiu
como um raio, e eu comecei a gargalhar em histeria, esta lembrança me renderia
pelo menos uns dois pontos em nosso embate.
─
Você por um acaso sabem da história do ladrão? ─ pergunto para os outros três.
─
Não se atreva ─ Marcelo arregalou os olhos ─ ou eu conto o que você fez a umas
semanas atrás em dalas.
─
Sabe ─ eu começo tomado pelo desejo de vingança ─ gosto de imaginar essa
história com a musica da fases subterrâneas do super Mario ao fundo.
***
Lembrança numero 6
Marcelo 3 VS 3 Nando
TAN
TANANANANA
NANAN…
Delegacia de Bituruna-PR Há muito tempo, as duas da madrugada.
O
telefone toca, o oficial em serviço acorda em um susto. O soldado Pimpão fora
transferido para aquela cidadezinha há poucos dias, viera da capital, então
aquilo para ele era um estado permanente de férias, era seu primeiro plantão
noturno, e o telefone tocava.
─
Delegacia de policia boa noite, Soldado Pimpão falando, qual é a emergência? ─
ele atende com uma voz rouca.
─
É... alô é da policia? ─ a voz do outro lado da linha fala sem graça, a voz de
um rapaz, pela voz não mais do que dezessete anos.
─
Foi o que eu falei, quem está falando? ─ pergunta o soldado ríspido, odiava
falar ao telefone.
─
Bem ─ a voz continua, mas faz uma pausa.
─
Pelo amor de deus, se isso não for um trote fala logo cidadão ─ o oficial
resmunga mais ríspido ainda.
─
Não, não é um trote não senhor ─ continua a voz apavorada ─ é que, bem eu não
sei como falar, é meio complicado, eu não sabia para quem ligar... Ai, Ai.
─
Desembucha logo guri.
─
Está bem, bom... um amigo meu disse que ia ir roubar uma betoneira em uma
construção ─ a voz começa a falar ─ e eu como um cidadão de bem, honesto e
integro que sou, vim impedir ele... ─ outra pausa ─ mas acontece que quando nós
estávamos carregando a betoneira ela virou na minha perna, bom... meu amigo se
apavorou quando viu o sangue e saiu correndo, e bem... ─ um suspiro rouco ─ eu
fiquei meio que preso aqui ─ a voz termina de falar, o soldado não responde
nada ─ bom não sei, o senhor podia, sei lá, mandar alguém aqui para me ajudar?
─ pergunta por fim, o soldado pigarreia.
─
Bom qual é o endereço ai? ─ pergunta.
─
Não sei direito, é Rua Ipiranga, não sei o nome, é perto da igreja... ai..
ai...
─
Está bem, vamos ver se temos alguma viatura na redondeza, não saia dai ─
finaliza o soldado desligando o telefone.
─
Ouvi o telefone ─ outro policial entra na sala ─ alguma ocorrência? ─ soldado
pimpão fica olhando para o telefone, depois para o colega depois para o
telefone novamente então para o papel com o endereço.
─
É, uma pessoa ligou disse que está neste endereço, parece que foi roubar uma
betoneira e a maquina virou na perna, será que devemos mandar averiguar?
─
O que? Não, é que você é novo por aqui, isso deve ser trote, acontece muito por
aqui.
TAN...
TANANANANA NANAN…
Dez minutos depois...
TAN
...
TANANANANA NANAN…
O
telefone toca novamente.
─
Delegacia, Soldado Pimpão falando ─ atende o policial.
─
Oi, sou eu de novo, só pra saber se o senhor já mandou alguém aqui ─ responde a
voz ─ é que não querendo apresar o serviço de vocês, mas é que minha perna já
está ficando rocha e... eu acho que estou começando a desmaiar.
─
Fique calmo rapaz, a ajuda já esta a caminho ─ respondeu o oficial.
─
Ah, ta, muito obrigado senhor, boa noite.
TAN…
TANANANANA NANAN…
O
oficial desliga o telefone.
─
Viu nogueira, o cara da betoneira ligou de novo, disse que a perna ta ficando
roxa, não era o caso de alguém ir verificar?.
─
Bom, se quiser ir pode ir cara, mas vai perder a viagem.
TAN
TANANANANA NANAN…
***
─
Sim o cara da betoneira era o Marcelo ─ terminei de contar a história, os
outros três me olham incrédulos de boca aberta, Marcelo está vermelho ─ por
isso que o Marcelo é o mais branco da família, a mãe dele deu uma surra nele
tão bem dada naquele dia que ele chegou a descolorir.
─
Você foi avisado! ─ Marcelo levantou gritando ─ eu estava com a intenção de
levar esse seu segredo para o tumulo, mas você pediu! ─ eu olhei nos olhos
dele, e vi ali verdade, ele ia mesmo contar, meus olhos correram para Daiane,
que olhava para Marcelo.
─
Não cara ─ falo olhando de novo para Marcelo ─ não faz isso, por favor.
─
Ta ai, o que pode ser mais vergonhoso do que acabamos de saber... heim ladrão! ─ Milena fala em tom de chacota,
meu primo olha para ela irado, e fala apontando para mim, eu olho para Daiane
preparando minha defesa.
─
Ele ficou com um travesti! ─ Marcelo fala, eu olho depressa para ele.
─
Cara, as histórias deveriam ser verdadeiras! ─ falo.
─
Mas isso é verdade ─ ele sorri com malicia ─ é claro que você não iria se
lembrar, pois tava caindo de bêbado, mas nosso querido amigo Ma-mah pode
confirmar tudo ─ ele fala.
─
De novo o álcool? ─ Milena fala ─ é sério pessoal vocês bebem demais.
─
Vamos Marlon conte a ele! ─ Marcelo fala, eu o olho suplicante, Marlon fica em
silencio, sua respiração se acelera ao sustentar meu olhar.
─
Grandes coisas ─ falou ele ─ temos um Gay e uma Lésbica aqui ─ ele fala ─ eu
não me importo com isso, você? ─ ele pergunta para Daiane.
─
Eu... ─ ela me olha espantada ─ para mim também não ─ ela fala indiferente por
fim.
─
Bom, eu tenho uma pergunta ─ fala Milena tão indiferente quando Daiane ─ das
histórias que vocês contaram, o Marcelo quase matou você meia dúzia de vezes
quando era criança! ─ ela olha de mim para Marcelo ─ por que em sã consciência
veio morar com ele depois de adulto?
─
Eu... hã...
Começo
a gaguejar, simplesmente a resposta não me vinha, eu olhei para Marcelo que já
tinha se acalmado tinha sentado na minha frente estava com os braços cruzados.
Foi
ali que outras lembras me vieram a mente...
Da
vez que ele me salvou de morrer afogado, quando eu pulei de um trampolim em uma
piscina de mais de dois metros de profundidade, eu tinha cinco anos, não sabia
nadar, mas via pessoas pulando daquele lugar e se divertindo ai pensem por que não?... Marcelo me tirou da água
eu já estava quase desmaiando...
Lembrei
de quando eu não entendia a matéria de matemática do colégio e iria ter prova
no outro dia, Marcelo passou a noite me ajudando, líamos e relíamos as paginas
do livro, fazíamos exercícios e refazíamos os que já estavam no caderno, eu
levei bomba naquela prova mesmo assim, mas o que vale é a intenção.
Dos
biscoitos de chocolate que ele deixava no meu quarto das vezes que ficava na
minha casa, dizia que afastava os pesadelos, mas eu sabia que era por que minha
mãe não deixava eu comer chocolate e ele achava um absurdo.
Da
vez que eu estava apanhando de um grupo de meliantes do colégio, e Marcelo
apareceu para me ajudar... ajudar a apanhar, mas novamente, o que vale é a
intenção.
─
Ah ─ eu começo a falar, sinto os olhos de todos em mim ─ ele foi meu primeiro
amigo, ele é mais do que um primo, ele é um irmão mais velho que eu nunca
tive... Eu amo ele.
Posso
ouvir alguém fungando, aposto que Marlon esta chorando. Marcelo se levanta, ele
sorri.
─
Eu também cara ─ ele me abraça ─ se eu não fosse eu, também iria querer ser meu
irmão.
Eu
o abraço de volta, sei que esse é o jeito de Marcelo dizer eu te amo, os outros
vem se juntar ao nosso abraço.
─
Nossa, isso daria um livro não? ─ Marlon fala depois de um momento.
─
Um livro nãos sei ─ eu falo ─ mas na certa uma boa história.
─
Hei ─ Ane se separa de nosso abraço ─ mas lembre-se, nada de citar nomes moço!
─ ela ri, Marlon também se solta do abraço.
─
Nada disso! ─ ele fala com as mãos na cintura ─ se eu estiver na história quero
que meu nome tenha um destaque!
─
É ─ Milena vai para o sofá ─ eu também não me importaria.
─
Eu também não ─ Marcelo fala ─ seria um desperdício se meu nome não ficasse
gravado para a história.
─
Pode deixar Ane ─ eu falo a abraçando ─ seu desejo será respeitado!
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